Descrição
Em evento em Porto Seguro, Bolsonaro, que questionou as vacinas e a seriedade da pandemia em várias ocasiões, compara os efeitos colaterais de vacinas a transformações absurdas, como virar jacaré. Esta posição foi reiterada pelo presidente, que, após uma campanha intensa contra o distanciamento social e as medidas de prevenção, testou positivo para o vírus.
Até essa data, registravam-se 184.827 óbitos pela covid-19.
Dados do site https://covid.saude.gov.br
Informações Gerais
Descrição
Em evento em Porto Seguro, Bolsonaro, que questionou as vacinas e a seriedade da pandemia em várias ocasiões, compara os efeitos colaterais de vacinas a transformações absurdas, como virar jacaré. Esta posição foi reiterada pelo presidente, que, após uma campanha intensa contra o distanciamento social e as medidas de prevenção, testou positivo para o vírus.
Tipo da evidência
Formato
Atores envolvidos
Temas
Agentes institucionais envolvidos
Número de óbitos registrados na época em que este fato aconteceu
184827
Dados da fonte de informação
Data da publicação
17 de dezembro de 2020
Título original
Bolsonaro: "Se tomar vacina e virar jacaré não tenho nada a ver com isso"
Fonte de coleta (Dados da fonte de informação)
Portal UOL
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O que diz a ciência
Conteúdo sobre o que diz a Ciência
Em discurso proferido em Porto Seguro, na Bahia, o ex-presidente Jair Bolsonaro questionou, sem embasamento científico, a eficácia e a segurança das vacinas contra a covid-19. Um dos argumentos centrais foi a suposta suficiência da imunidade natural adquirida por infecção prévia. Contudo, essa afirmação já não se sustentava diante das evidências disponíveis à época. Embora a covid-19 estimule a produção de anticorpos contra o SARS-CoV-2, a imunidade gerada pela infecção é heterogênea (variando entre indivíduos) e pode ser menos duradoura que a proporcionada pelas vacinas. Registros de reinfecções em menos de três meses — intervalo inferior ao período médio de proteção vacinal — já eram documentados, reforçando a importância da imunização. Além disso, incentivar a exposição deliberada ao vírus como alternativa à vacina é antiético e perigoso, uma vez que a doença pode evoluir para formas graves, resultando em óbitos ou sequelas prolongadas, como a síndrome pós-covid (ou covid longa).
Sobre a isenção de responsabilidade das farmacêuticas, Bolsonaro alegou que a cláusula contratual com a Pfizer impediu a aquisição de suas vacinas. Há, porém, uma contradição evidente: o mesmo tipo de cláusula não obstruiu a parceria do governo com a AstraZeneca, firmada em 2020 via Fiocruz. Vale contextualizar que essa condição era um padrão global em razão da emergência sanitária, aplicada a todos os países que adquiriram vacinas. A segurança dos imunizantes, inclusive, foi rigorosamente monitorada em estudos clínicos (fases 1, 2 e 3) e continuou sob vigilância na fase pós-comercialização (fase 4). É nessa última fase que a notificação e a documentação de eventos adversos permitem analisar uma possível relação causal dos eventos com a vacinação. Caso seja constatado que os riscos superam os benefícios, o uso da vacina pode ser interrompido. Dados consolidados confirmam que eventos adversos graves são raríssimos, e órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) mantêm a confiança nas vacinas, respaldadas por evidências de eficácia e segurança. Por isso, o consenso de que as vacinas são seguras permanece.
Ao sugerir que as vacinas “mexem no sistema imunológico” de forma prejudicial, Bolsonaro demonstrou desconhecimento sobre seu funcionamento. Justamente esse “mexer” é o princípio de toda vacina, uma vez que, ao simular o agente infeccioso, a vacina estimula o sistema imune a criar defesas específicas, sem os riscos da infecção natural. Enquanto as vacinas induzem uma resposta controlada, a covid-19 pode desencadear reações inflamatórias exacerbadas, associadas a complicações graves e até ao desenvolvimento de doenças autoimunes. Portanto, a comparação é equivocada, visto que as vacinas estimulam o sistema imunológico de forma segura e previsível, ao passo que o vírus o faz de modo desordenado e perigoso.
A acusação de que as vacinas eram “experimentais” não condiz com os fatos. É importante destacar que todas as vacinas passaram por etapas rigorosas de testes, com aprovação condicionada aos resultados robustos da fase 3. A fase 4, de farmacovigilância, não as torna experimentais, mas garante monitoramento contínuo — prática padrão para qualquer medicamento. Quanto à agilidade na aprovação, a Lei nº 14.006/2020, sancionada por Bolsonaro, previa autorização em 72 horas para vacinas já registradas por agências de referência, como Food and Drug Administration (FDA), European Medicines Agency (EMA), Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA), National Medical Products Administration (NMPA). A Anvisa, porém, manteve a prerrogativa de análise independente, evitando aprovações automáticas que poderiam ignorar particularidades da população brasileira. Nenhum país adotou liberação sem revisão própria, o que reforça a cautela da agência.
Por fim, a alegação de que as vacinas careciam de “comprovação futura” é falsa. Desde 2020, os dados dos ensaios clínicos, submetidos a múltiplas agências regulatórias, já comprovavam a eficácia e a segurança. A vacinação em massa foi decisiva para reduzir hospitalizações e mortes, permitindo o retorno à normalidade. No Brasil, porém, o discurso antivacina de Bolsonaro somado à lentidão na aquisição de doses, provavelmente contribuiu para atrasar a campanha de imunização, agravando o impacto da pandemia. Estudos estimam que milhares de vidas poderiam ter sido salvas com uma resposta mais ágil, evidenciando o custo humano do negacionismo e da desinformação.
Fontes
Anvisa, Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Uso emergencial de vacinas: Anvisa estabelece prazo de até 10 dias para dar decisão. 14 dez 2020. | BRASIL. Lei nº 14.006, de 28 de maio de 2020. Altera a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020. | Graña C et al. Efficacy and safety of covid-19 vaccines. Cochrane Database Syst Rev. 2022. | Polack FP et al.; C4591001 Clinical Trial Group. Safety and Efficacy of the BNT162b2 mRNA Covid-19 Vaccine. N Engl J Med. 2020. | Representante da Pfizer confirma: governo não respondeu ofertas feitas em agosto de 2020. Senado Notícias. 13 mai 2021. | Venaglia G. Lei pode obrigar Anvisa a analisar possível vacina em apenas 72 horas. CNN. 9 dez 2020. | Walsh EE et al. Safety and Immunogenicity of Two RNA-Based Covid-19 Vaccine Candidates. N Engl J Med. 2020. | WHO, World Health Organization. Coronavirus disease (Covid-19): Vaccines and vaccine safety. 8 out 2024. | WHO, World Health Organization. Vaccine efficacy, effectiveness and protection. 14 jul 2021.